domingo, 18 de outubro de 2009

Futuro ou Museu de grandes novidades

Quando a ficção escreve por sobre as dobras do tempo, o futuro sequencial (presente-passado-futuro), teleológico, da forma como o pensa o Ocidente, é posto à prova e a escrita literária parece pretensiosamente ante-tecer o amanhã com nós tão precisos que quase chega a ser inverossímil. Esta a impressão que tive este fim de semana ao acompanhar a notícia do abate, por traficantes, de um helicóptero da Polícia Militar do Rio de Janeiro com a sensação de ouvir o sussurrar da voz do narrador do romance O ano em que Zumbi tomou o Rio (2002) do escritor angolano Agualusa, enquanto as imagens videoclipticas do jornal invadiam as minhas retinas:

“Helicópteros rodopiam no céu, ao longe, agitando as águas mortas da lagoa. Francisco Palmares espreita-os através da lente do binóculo... Vê-os acometerem contra o Morro da Barriga, ali mesmo, onde os últimos revoltosos buscaram refúgio. Àquela velocidade estarão sobre eles, a cuspir fogo, em poucos segundos... Então, um uivo luminoso risca o azul puríssimo da tarde numa curva elegante e atinge o primeiro helicóptero. A explosão torce o céu, estende-o, contrai-o, sorve violentamente todo o ar, arrastando duas aeronaves que seguem atrás. Um dos aparelhos consegue recuperar o equilíbrio. O outro, porém, mergulha às cambalhotas de encontro aos prédios aguçados, lá muito em baixo, e desfaz-se – desfaz tudo ao seu redor – num grande e prolongado ribombar das chamas”.

Todas as vezes que a literatura antecipa-me o viver, no corpo carrego a náusea entorpecente de todo o devir.

sábado, 10 de outubro de 2009

O retorno de Ulysses

Nas letras natimortas escritas pela quilha do barco nas águas, reside o segredo de Poseidon: sem Ulysses, náugrafo (sic) da linha tênue que separa o céu do mar, o oceano sequer seria ponte de continentes-ilha, apodreceria... Sem Ulysses, Poseidon, entorpecido, dormiria ainda hoje em uma lápide sem inscrição.